Depois de entender o fundo do poço, estou satisfeito onde estou. Depois de compreender a tristeza, estou confortável com o que sinto agora. Depois de perceber a importância da minha dor, estou contente por poder senti-la. Parece definitivamente perturbador ler alguém dizendo que está tudo bem, mesmo não estando tudo bem. Deve ser realmente indigesta a ideia de ter que aceitar que é possível viver sem estar feliz, mas também deve parecer um pouco falso o discurso de que o fundo do poço é confortável. Mas, se me permite perguntar, o que você vê no fundo do seu poço? O fundo do poço te assusta?
Não é muito complicado problematizar a vida. Basta apenas um minuto de introspectividade para refletir, basta alguns minutos dedicados para as redes sociais, basta não receber aquela mensagem esperada e basta ter consciência de si e do seu papel na vida que protagoniza para perceber que estamos envolvidos em problemas o suficiente para esquecer o que nos faz humanos. E são tantas as possibilidades que viabilizam nosso desencontro da humanidade que parece até um plano do divino para que jamais estejamos satisfeitos com nossas pequenas chances de desconstrução, construção e evolução. Parece que somos afastados da oportunidade de vivenciar a plenitude de uma vida cheia de variáveis.
Não tenho grandes considerações para dizer sobre a alegria, sobre a vida que é vendida no Instagram, sobre as filosofias de gratidão que são constantemente cagadas por quem escolheu fugir da realidade. A perfeição é comercial, ela vende, ela atrai olhares e seduz quem nem sequer está perto de alcançá-la. E quem me disse tudo isso? O fundo do poço. Foi na minha realidade, na minha infelicidade e no meu fim da linha que me tornei capaz de compreender que não é verdade a história de que temos que ser contrários ao que vivemos hoje. Se somos ensinados a trair nossos sentimentos todas as vezes que sentimos algo que não compreendemos, como poderíamos ser capazes de conviver com algo pleno e satisfatório como a perfeição? A dor e a tristeza também são comercializáveis, mas por que somos empurrados para longe delas quando temos que senti-las?
Não é normal se sentir infeliz, assim como não é normal se obrigar a estar feliz. No meu poço, fui capaz de ver o que não via. Foi na solidão e na escuridão que me tornei capaz de sentir, de me sentir. Não, não estou dizendo que você deve iniciar agora uma jornada de autoconhecimento pela sua dor. Só gostaria de dizer algo que jamais escutei de qualquer outra pessoa: está tudo bem se você não está bem. Você não precisa se obrigar a escalar o fundo do poço se não tem forças para o fazer sozinho. Você não precisa querer sair do fundo do poço se sente confortável aí. Você não precisa passar mais nem um dia aí se sentir que esse não é o seu lugar. O mundo é repleto de possibilidades, de variedades, de momentos e de instantes. Viva os seus sem medo daquela alegria que tentam constantemente nos empurrar garganta abaixo. Você não precisa ser feliz hoje. Eu não precisei.